Psicologia Aplicada

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Gente! O Raimundo Pinto tentou enriquecer de várias maneiras, sempre com trabalho ao ar livre, suando. Comprou e exportou jumentos e éguas dos estados do Piauí e do Tocantins para um frigorífico de equinos em Minas Gerais; garimpou, sem bamburrar, nas profundezas das matas do estado do Pará e foi um misto de paizão e marido moral de aluguel de vinte e oito putas, em média, num bordel na cidade de Marabá-PA. Sem dúvida, cobrava taxa de proteção e se vangloriava por nenhuma de “minhas meninas”, palavras dele, ter levado mão de vaca ou sofrido alguma violência não reprimida por um dos seus leões de chácara de plantão e tem mais: pagava mensalmente uma ginecologista para cuidar de suas profissionais.

Além disso, com sua diplomacia de resultados, paparicava o delegado local junto com alguns dos seus subordinados, dando-lhes tratamento vip no aconchegante bordel. Essa estratégia fez daquele puteiro um ambiente pacífico, acolhedor e concorrido: garotas em iniciação e também as veteranas ficavam numa lista de espera, atrás de uma vaga para alí se instalarem. E acredite quem quiser, no grande saguão daquela zona tinha uma frase copiada de restaurante de beira de estrada estampada na parede com letras garrafais que ajudava a dignificar e valorizar o ambiente: “Aqui está a minha família para receber a sua.”

Já velho e moído, Raimundo Pinto conseguiu uma merreca de aposentadoria e um bom pé de meia pelos doze anos em que poupou dinheiro ganho no cabaré que conduzira com gerenciamento exemplar. Com a boa grana contruíu trinta kitnets; dezoito em Palmas e doze em Miracema-TO, as quais, complementavam sua renda com os aluguéis.
Em tempos idos, lá na terceira infância, Raimundo Pinto frequentou uma escolinha rural por dois anos. Dali saiu sabendo as quatro operações e pronto para escrever um bilhete. Agora, na era das redes sociais, entrou para as estatísticas dos milhares de tiozões pretensamente fundamentados que invadiram o watsapp.

Com uma cognição, segundo ele, desenvolvida à base de palmatória, Raimundo Pinto fez bonito. Vive com a boca cheia de Freud, Jung, Wilhelm Reich, Skinner, tentando impressionar gente besta, mas foi dito por um atento observador que ele não passa de um nerd de “nerda,” confuso, tentando também, com essa farta sabedoria, impressionar sua sobrinha e afilhada Marinete, estudante de psicologia. Claro! se acha autossuficiente, um verdadeiro conhecedor da área e isso gera dificuldades no relacionamento entre ele e a querida afilhada, na qual ele projeta fantasiosamente o psicólogo que queria ser.
– Alô! É a minha afilhada Marinete?
– Sim!
– Aqui é o seu padrinho Raimundo pinto!
– Reconheci a sua voz, meu padrinho!
– Tô aqui com a sua mãe, usando o telefone dela. É verdade que você está fazendo bico no comitê eleitoral do candidato Araújo?
– Tô! É um complemento de renda que vai me ajudar.
– Sua mãe me falou que você está namorando o Cipriano, que também circula por lá… Fique esperta!
– Por que?
– Você sabe, sou rodado, quero o seu bem, até lhe ajudo na anuidade com muita satisfação, mas…
– Meu padrinho, cuidado com o que o senhor vai falar depois do mas! Entretanto, fale!
– Querida, vou usar de toda sinceridade. O Cipriano não é homem para você. É vinte e oito anos mais velho, tem duas pensões alimentícias nas costas e eu nem sei de onde ele retira dinheiro para pagar. Você está fazendo um belo curso e merece um compromisso com um homem mais qualificado para não se tornar o troféu de um pé rapado. O Olacyr, rei da soja, podia bancar esposa troféu. O Temer, pode. Mas o Cipriano?!… Meu Deus! É um assessor de porra nenhuma, um ASPONE.
– Foi minha mãe que lhe incentivou para dizer essas coisas?
– Filha, ela não mentiu, só quer o seu bem!
– Posso falar, dizer o que penso?
– O Cipriano, vivido e mala como é, todo sincerão, cheio de atitudes, não passa de uma farsa! Vai ser uma marcha ré na sua vida!
– Meu padrinho, o senhor vai deixar eu falar?
– Querida, sua mãe me falou que você aplicou uns psicotécnicos aí no seu estágio e no final você não fez a separação correta, trocou normais por malucos e malucos por normais. Que tipo de profissional você vai ser? Esse sujeito está fazendo você perder o foco!
– O senhor vai deixar eu falar?
– Esse tal de Cipriano, se você não se livrar dele, vai querer passar para dentro da sua futura clínica, para ajudar, aí vão afundar juntos. Falo tudo isso, não só pelo pedido da sua mãe, é porque lhe quero bem. Fique longe desse cara, filha!
– Meu padrinho sabichão, vai ou não deixar eu falar?
– Digo mais: Ele se acha o cara, mas é apenas um psicólogo de boteco, um raizeiro com raízes invisíveis, em forma de lero, que vai confundir sua cabeça!
– Eu quero falar também!…
– Se você cair na lábia dele, quando se der conta, ele já vasculhou a sua vida, inventou e colocou traumas em você que não existem e ainda vai culpar os seus pais por você ser assim, meio ausente. Mas acredite, você é bem normal. Falo isso porque conheço um pouco essa psicologia que você está estudando. Ele, grande manipulador, vai fazer você ficar agradecida pelas porcarias que está a lhe inculcar e você, satisfeita, vai achar que ele está fazendo uma bela faxina no seu ego, eliminando os tais traumas que – sou franco em dizer – você nunca os teve. Vai lhe virar pelo avesso. Por favor! Tente não deixar ele se tornar o psicólogo fajuto da psicóloga em formação. Conheço o jogo, em certos momentos você vai ganhar leveza e bem-estar com as massagens recebidas na alma. Se queimarem um bagulho juntos, aí pronto!… Vão descobrir a fórmula para salvar a humanidade!
– Meu padrinho, posso falar também? Até agora, apenas ouvi…
– Claro, fale!
– O psicólogo de araque que eu vi vomitar besteirol até aqui foi o senhor. Preste bem atenção! Vou falar quatro palavrinhas e depois desligar: vá tomar no c*!
Raimundo Pinto, com certo espanto, virou-se para sua irmã e falou:
– Essa menina vai dar trabalho, está apaixonada! Deus queira que ela acabe esse incutimento antes de engravidar!
Ao que sua irmã, com semblante carregado, lhe respondeu:
– O sangue de Jesus tem poder!

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JOSÉ EPIFANIO PARENTE AGUIAR

Sou um Baby Boomer, portanto um véi esquisito para as gerações X, Y, Z e um monstrengo para a geração Alfa.

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